TRADIÇÕES
Fecho os olhos e toda a azáfama, toda
a alegria, toda a magia desse tempo bonito da Páscoa da minha infância, na
pequenina aldeia transmontana onde nasci, numa das encostas do Marão, são imagens
vivas a passarem no ecrã da minha memória.
Com que entusiasmo eu vivia esses
dias! Os dias que precediam o Domingo de Páscoa e o vasculhar dos cantos da
casa na remoção dos lixos mais escondidos e teimosos, e das teias de aranha mais
renitentes; o cuidado posto no lavar e esfregar do soalho, no limpar dos
vidros, na procura das flores: lírios brancos e roxos, camélias, aleluias (e
não podia faltar o alecrim para benzer e guardar para as trovoadas), flores
dessa época, para embelezar a casa, preparando-a para receber Jesus Ressuscitado, que nos era apresentado na Cruz para beijarmos.
Na aldeia havia apenas uma cameleira.
Ficava num quintal murado, sobranceiro à rua principal, que liga um extremo da
povoação ao outro, e era da senhora Carminda, a professora. Toda a gente ia pedir
camélias - japoneiras, como dizíamos - à senhora professora. Ela emprestava-nos a
chave do portão e lá íamos nós cortar lindos ramos de camélias vermelhas e suas
folhas de um verde muito escuro e brilhante. Lindas!
Era trabalho de crianças. Fazíamos uma enorme algazarra à volta da cameleira, que soa ainda, viva, aos meus ouvidos.
E a azáfama na cozinha em volta da confeção das roscas de pão de ló e o cheirinho que se espalhava pela casa quando saíam do forno, douradinhas, e se estendiam fumegantes sobre a tampa da “masseira”. E o repenicar alegre dos sinos, no Sábado Aleluia, anunciando a Ressurreição de Jesus. E, depois, no domingo, a ansiedade com que esperávamos o tocar da sineta da Capela da Senhora da Ajuda anunciando que o Compasso tinha chegado à povoação:
Era trabalho de crianças. Fazíamos uma enorme algazarra à volta da cameleira, que soa ainda, viva, aos meus ouvidos.
E a azáfama na cozinha em volta da confeção das roscas de pão de ló e o cheirinho que se espalhava pela casa quando saíam do forno, douradinhas, e se estendiam fumegantes sobre a tampa da “masseira”. E o repenicar alegre dos sinos, no Sábado Aleluia, anunciando a Ressurreição de Jesus. E, depois, no domingo, a ansiedade com que esperávamos o tocar da sineta da Capela da Senhora da Ajuda anunciando que o Compasso tinha chegado à povoação:
"Vai começar pelo Povo de
Cima!...”
"Está no cimo da Costa da Fonte!..."
"Vai pela Poça Velha!..."
"Está no Fundo do
Povo!..."
"Está a chegar à casa da senhora
Constança!..."
Eram expressões usadas enquanto os nossos coraçõezinhos batiam apressadamente dentro do peito.
Eram expressões usadas enquanto os nossos coraçõezinhos batiam apressadamente dentro do peito.
Quando chegava à casa da senhora Constança,
corríamos todos para a sala; a próxima casa, embora um pouco distante, seria a
nossa.
Como eu gostava de todo o ritual religioso que antecedia o Domingo da Ressurreição: a "Via-Sacra", que todos os
dias à noite, durante a quadra da Quaresma, era rezada na Capela da Senhora da
Ajuda; a subida ao "Calvário", monte acima, dramatizando o percurso
feito por Jesus até ao Calvário quando da Sua Paixão e Morte, geralmente aos domingos à tarde; os sermões na Igreja de Louredo, caminhando
meia hora para lá e meia hora para cá, descendo a encosta até ao rio e do rio à igreja, e vice-versa, que durante três dias preparavam as
pessoas para a Confissão Pascal...
Tenho saudades desse tempo. Desse
tempo bonito e mágico da minha infância.
Tempo de tradições, que tão deliciosas lembranças deixaram na minha alma.
Tempo de tradições, que tão deliciosas lembranças deixaram na minha alma.
Jeracina Gonçalves
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