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sábado, março 22, 2014

OS SAPATOS

O sol e o vento varrem as ruas do Porto. Vento que trespassa os ossos. 
Sob um céu azul lavado, sem mácula, desço a avenida da Boavista e enfrento a agressividade do vento, que me fustiga sem piedade. Põe-me o cabelo em alvoroço, a pele toda eriçada, e transmite-me um desconsolo, um desconforto tamanho que me enregela os ossos e me convida a entrar numa loja de agasalhos que encontro no meu trajeto, do lado esquerdo, para procurar um cachecol que ajude minorar o desconforto deste dia agreste a mimar a cidade tripeira. E não é difícil encontrá-lo. Também não é caro. É de lã: vermelho e azul. E dá um toque de cor e alegria à toilette à base de preto que escolhi vestir hoje. É bem-vindo. Protege-me o pescoço e torna-me bem mais agradável o caminhar de  encontro ao vento zangado, provocador e agressivo a castigar a cidade neste dia claro e limpo.
Sinto-me agora bem mais confortável; mas “nem tudo são rosas”. Nem tudo está ainda perfeito: os sapatos de salto alto que escolhi calçar esta manhã principiam a demonstrar-me não ter feito a escolha mais acertada. O peso do percurso começa a pesar-me nas pernas e nos pés, e há que fazer qualquer coisa para remediar a situação antes que soçobrem e me deixem ficar mal. É tempo de começar a deitar o olhar sobre as montras de algumas lojas de calçado ao longo do percurso. São elas que agora me cativam e detêm toda a minha atenção: «Ali! Aqueles sapatos de rampa são os ideais!» - digo para os meus botões, ao passar por uma montra  de uma  sapataria onde estão expostos vários pares de sapatos. Ali está a solução para o meu actual problema, e está a olhar descaradamente para mim. Ali está , a convidar-me a entrar, a varinha mágica capaz de operar o milagre de minorar o queixume dos meus pés e tornar agradável a caminhada ao longo da avenida até ao meu destino. Está ali. E eu não resisto ao seu olhar tentador. Entro e dirijo-me imediatamente para a montra onde os sedutores se encontram. São mesmo aqueles. Não quero outros. São aqueles. Aqueles que despudoradamente me convocaram o olhar e se me insinuaram num convite irresistível. E continuam a insinuar-se, tirando-me todo o interesse por quaisquer outros. 
A empregada traz-me vários pares para experimentar. Mas… não. "Não são precisos outros. São aqueles"- digo apontando os atrevidos sedutores, que me cativaram o olhar ainda na montra. São realmente os ideais. São de rampa, nem muito altos nem demasiado baixos. É deles que necessito para que o céu se torne ainda mais maravilhosamente azul, e o vento passe de fúria vergastadora a carícia amorosa a oferecer delícias e vigor à minha caminhada. Os meus pés esperam desesperadamente por eles e vão agradecer-me o cuidado. Não devo nem posso fazê-los esperar mais. É tempo de acarinhá-los, de dar-lhes algum conforto antes que feneçam irremediavelmente. 
Calço-os. É «amor à primeira vista»: uma capa deliciosamente macia, envolvente e confortável cinge os meus pés num abraço amoroso e delicado.
«Quanto custam?», pergunto.
«Bem, o preço é…», responde-me a empregada.
Nem quero acreditar no que oiço! São muito baratos. Se calhar não prestam, mas resolvem-me agora o problema e, de momento, é o que me interessa. Entrego os que trazia calçados para embrulhar e saio da loja com sapatos novos nos pés.
Que maravilha! Sim, são estes. São pele sobre pele, veludo macio e acariciante a envolver os meus pés feridos pelo sofrimento da caminhada. E eles, os meus pés, gratos, ganham asas e voam sobre o empedrado do passeio, continuando o percurso pela avenida da Boavista, até ao Hotel Cidade do Porto. 

quinta-feira, março 20, 2014

É TEMPO DE RENASCER


São belas as imagens
que a Natureza 
em seu renascer
submete ao nosso olhar
indiferente e apressado!

A beleza de um ramo em brotos 
a abrir-se
da árvore a florir;
do passarinho 
atarefado 
apanhando secos pauzinhos 
para seu ninho construir;
da água da nascente 
bem límpida e transparente 
livremente a fluir;
dos campos verdejantes;
das cascatas refrescantes;
da abelha 
a obreira
a zunir de flor em flor;
da borboleta multicolor;
da vaquinha 
pachorrenta
no verde prado a pastar;
do riacho a soluçar;
do passarinho a cantar...

São imagens de muita beleza!
São ofertas da Natureza!
Jeracina Gonçalves
in "JANELA ABERTA"

sábado, março 08, 2014

SER PROFESSOR


Ser professor é doação.
É entrega.
É cabeça e coração,
Oleiro e arquiteto
De cada nova geração!

Jeracina Gonçalves

OLHOS NOS OLHOS


Olhei o mar turbulento, em ânsias de destruição.
Olhei-o, olhos nos olhos, no meu olhar, o coração.
O mar, doce e sereno, à minha praia se deu.
À minha praia rumou, e mar chão aconteceu.


Jeracina Gonçalves