Pesquisar neste blogue

terça-feira, julho 02, 2019

UMA MANHÃ NA PRAIA

 ... emana uma toada ronronante, embaladora que me apetece e me relaxa; toada terna de um mar amigo, bonacheirão: aproxima-se, afasta-se, aproxima-se, afasta-se, ritmada, contínua, muito calma, muito mansa…
Ao longe, pequenos barcos de pesca fazem a faina na grande planície líquida que se alarga para lá da linha do horizonte até à costa africana. Mais próximo, navegam dois barquinhos à vela.
Aconchegada sob a sombra protetora do guarda-sol de colmo, vou observando o vai e vem lento das águas mansas e a enorme praia de areia macia, a esta hora quase deserta. Contam-se pelos dedos das mãos as pessoas presentes: um casal joga badmington; duas crianças brincam na areia com os seus baldinhos coloridos: um verde e outro amarelo, e, junto à linha de água, onde a areia é mais rija e torna o caminhar mais agradável, caminham mais ou menos, apressadas algumas pessoas.
.....
Fecho os olhos.
Deitada na espreguiçadeira deixo-me levar ao sabor do canto doce deste mar tranquilo, arrastada pela sua voz mansa, melodiosa para os meus ouvidos, que me transporta pelos caminhos da fantasia. Mergulho no interior do seu mundo silencioso, cheio de vida e de mistério, em busca de mitos perdidos no emaranhado dos tempos; vagueio por mundos de sonho. Mundos de fausto e de esplendor descritos por Platão nos seus diálogos Timeus e Crítias, dormindo o sono profundo nas entranhas do mar (pelo que deixou descrito o grande filósofo, não dormirão muito longe daqui); percorro salões magnificentes por entre as suas colunas de jaspe e âmbar, de palácios habitados por seres semidivinos, aparentados com os deuses, cheios de sabedoria e de bondade. Seres que se deixaram enredar pelos “vícios” do poder e perdendo a virtude e as características divinas, atraíram a fúria dos deuses. No espaço de um dia e de uma noite de terramotos e inundações, pereceram para sempre sepultados nas profundezas deste mar que me enfeitiça.

Mitos perdidos no enredo dos tempos,
Engolidos por deuses em fúria, habitam teu
Seio profundo. Jazem em ti sepultados. 
Mundos de Platão, por Aristóteles negados.
 
A praia começa a encher-se, transformando-se numa enorme pinha de corpos besuntados, estendidos sobre toalhas coloridas na areia. Já perdeu, para mim, bastantes dos seus atrativos. Há já demasiada confusão para o meu gosto.
São onze e meia da manhã. Regresso ao hotel.
HORIZONTE AZUL
 Jeracina Gonçalves
     

                                                                                                                          






Sem comentários: