A palavra surgiu-me na mente, espontânea,
saída do nada.
Persistente,
incisiva, apossou-se do meu pensamento e dele não arreda pé. Baila, ciranda,
rodopia de um lado para o outro, sem suporte, bastão ou muro em que se apoie. Mas não desiste. Tento afastá-la sob os mais variados expedientes para que
dê lugar ao sono, que anseio, mas, possessiva, dominadora, insistente, usurpa-lhe o espaço e não deixa que ele tome o lugar, que em mim lhe é devido, como suporte da minha saúde mental e física,
me aprisione em seus braços reconfortantes, e me leve para o país dos sonhos. Desisto de
lhe opor resistência. Sei que não me dará sossego enquanto não lhe der a devida
atenção.
Salto da cama
e, de esferográfica em punho, vou tentar descodificá-la. Vou tentar determinar e entender
o seu significado. Se é que é possível; pois, a meu ver, o conceito de felicidade
é muito oscilante e variável de pessoa para pessoa. Vou, porém, tentar esmiuçá-lo,
esboroá-lo em pequenas partículas. E, talvez, então, me liberte e deixe que Hipnos
me envolva com o seu abraço retemperador e me transporte para os braços de
Morfeu.
Fecho os olhos. Tento penetrar o seu âmago, atingir o seu cerne. Uma pequena luz parece querer
iluminar-me o caminho, sugerindo-me que felicidade não é mais que a harmonia
entre os diferentes personagens que suportam o “Eu” global de cada um de nós. Ou
seja: a Felicidade será a consonância entre o Consciente, o Subconsciente
e o Inconsciente de cada um. Se esses três “personagens” do "EU" estiverem em sintonia,
esse sentimento de plenitude, de paz, que entendo por Felicidade, esse sentimento
que nos preenche quando estamos, agimos e somos o que a nossa consciência nos
inspira e são afastados os fantasmas que os põem em dissonância, essa paz interior, essa harmonia entre os três "personagens" do "EU", invadir-nos-á. E, se olharmos o
conceito de Felicidade por este prisma, parece-me lícito pensar que a
felicidade habita em nós, e em nós teremos de a procurar.
Claro que somos - e muito - influenciados pelos
outros na nossa ação e no nosso sentir do dia-a-dia. E se essa influência do
outro em nós, atinge a nossa integridade moral e o nosso “Eu” global entra em
dissonância, certamente nos sentiremos infelizes e derrotados. Mas parece-me
que só em nós estará a solução do problema e não valerá a pena procurá-la fora
de nós próprios, nem acusar o outro pela nossa infelicidade. Em cada
decisão que tomemos em relação a nós e ao outro, ou outros, teremos de agir sem
trairmos a nossa consciência moral. Assim como teremos de aprender a gerir as
nossas vitórias e derrotas com coerência, humildade e sentido de estar.
Todos
conhecemos pessoas que, parecendo ter tudo para serem felizes, são infelicíssimas; e outras, que a nossos olhos não têm qualquer razão para o serem, são-no plenamente. Se para uns é
preciso um bom carro, uma boa casa, boa roupa, boa comida e muito dinheiro para
se sentirem felizes, outros são-no vivendo na rua, livres, sem compromissos e
sem saberem se terão comida para a próxima refeição.
Quer o
conceito de felicidade, quer o caminho para alcançá-la divergem muito de pessoa
para pessoa. Cada um terá
de buscá-la em si próprio, aprendendo a viver com os seus fracassos, pequenos
ou grandes, a gerir sem arrogância as suas vitórias, as sua perdas, sem trair a sua
consciência moral.
Julgo ser este o principal caminho para uma vida feliz
Jeracina Gonçalves, Barcelos/Portugal
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