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domingo, outubro 14, 2018

A LAVADEIRA


 ..."durante os compridos e quentes dias de verão, metida no rio, saia arregaçada, com a água a dar-lhe pelos joelhos, bater a roupa na pedra era uma festa.  
Chegava logo pela manhã, bem cedinho, mal o sol coloria o horizonte, ensaboava a roupa branca e punha-a a corar estendida na relva verde da beirada do rio. 
Regalava-se de vê-la branquejar, e orgulhava-se de ninguém apresentar roupa mais limpa ou mais branca que a sua. 
Depois começava a lavar a roupa de cor: molhava, batia, esfregava, estendia, e cantava o tempo todo: “Ó oliveira da serra  Que o vento leva a flor...”  
-Pareces um rouxinol, rapariga. É um regalo ouvir-te!  
-“Quem canta seu mal espanta”, Ti‟ Ana. 
-Tens toda a razão, minha filha: “Tristezas não pagam dívidas”. É ditado antigo. E os antigos sabiam o que diziam.  
-Pois é, Ti‟ Ana. Se a tristeza resolvesse os problemas da gente, valeria a pena andar por aí com “cara de defunto”; mas, pelo contrário, torna-os ainda mais pesados e mais difíceis de suportar. Há que arregaçar as mangas, agarrar a vida com força e olhá-la de frente sem lhe mostrar medo, mesmo que o coração chore e sangre de dor. 
É o que procuro fazer. Às vezes muito a custo, Ti‟ Ana. Mas tem de ser. Os meus filhos pedem-mo. Exigem-mo. E merecem-mo todos os dias. Por eles farei tudo, Ti‟ Ana!
-Tens razão, Maria. Gosto de te ouvir.
Gosto dessa tua coragem, dessa força que te anima e te faz lutar pelos teus filhos e por ti.  
E ele, o teu home, já escreveu? 
-Não, Ti‟ Ana. Nem uma letra, nem um telefonema, nada. 
Já lá vão cinco meses desde que partiu. Sei que está vivo porque o Jaquim d‟Aurora escreveu à mulher e contou-lhe que o encontrara um dia destes, por lá. Mas dele não recebi nada; não dá sinal de vida. Esqueceu a mulher e os filhos"... 
A LAVADEIRA
"in" Histórias de Gente Simples
Jeracina Gonçalves
Barcelos/Portuga

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